MAGNO RIBEIRO
O poeta é um fingidor, finge tão completamente, que chega a fingir que é dor a dor que deveras sente
Capa Textos Fotos Perfil Livro de Visitas Links
Textos

TIJOLOS DE AFETO, CIMENTO DE ETERNIDADE

 

Ao meu lado ela, o equilíbrio que dança na corda bamba dos dias, a sutileza que corta o ar espesso das incertezas com a lâmina doce de seu olhar crítico. Sublime, como quem carrega estrelas nos bolsos e distribui luz sem alarde. Doce, mas não açúcar que se dissolve, antes, mel que permanece na memória da boca, desejada por mim que a escolhi como quem escolhe o Norte para se orientar, amada por todos como se ama a primeira palavra aprendida na infância.

 

De mim nasceu primeiro ele, minha primeira tentativa de imortalidade. Melhor versão de mim, como quem corrige os erros sem apagar a essência original. Cuidadoso como quem carrega água em peneira e consegue não derramar uma gota, atencioso ao ponto de antecipar necessidades que nem sabíamos ter. Os defeitos? Esmagados sob o peso das virtudes como flores silvestres sob pés de gigante.

 

Depois veio ele, que nasceu só dela, mas o coração decidiu amar além dos limites da biologia. O tempo, esse alquimista, transfundiu sangues, misturou DNAs de alma, fez do escolhido o eleito. Filho do equilíbrio, nascido da vontade pura de completar o que estava incompleto, de ser família porque família se é, não porque família se nasce.

 

Anos depois, quando julguei completa a minha sinfonia com ela, chegou de nós dois, a síntese, o melhor dos dois moldado em nova argila, mas com marca própria. Nascida quando já éramos mestres na arte de amar e de se perder um no outro, veio após quatro décadas como quem vem completar a música que pensava pronta. Sensibilidade que não se confunde com fragilidade, é forte como raiz que se aprofunda em terra boa, doçura que não adoça, mas alimenta a alma faminta de beleza verdadeira – minha menina.

 

Com os filhos vieram elas duas, as companheiras deles que se fizeram parte desta constelação que chamei de minha família. Personalidades distintas como dedos da mão, mas que juntas integram os acordes da mesma música familiar. Tão essenciais quanto o ar que se respira, trouxeram a completude que faltava à mesa onde todos nós nos sentamos para dividir o pão e a palavra.

 

A primeira delas nos presenteou com a eternidade em formato pequeno: ele, o neto, doce e sensível como quem carrega a ternura do mundo nos olhos curiosos, e ela, a neta, doce e altiva, pequena rainha que já sabe que o mundo lhe pertence por direito de encanto. Ambos são a expressão mais perfeita e completa desta geometria sagrada que iniciei. Neles, vejo o futuro caminhando com as pernas trôpegas da infância, mas já carregando no sorriso toda a herança de amor acumulada em décadas de construção familiar.

 

E chegaram também eles, os sobrinhos, dois galhos que brotaram na árvore como se sempre houvessem estado ali. Ele, o sobrinho, carrega nas veias o dom de servir, e na inteligência tímida esconde a solução para os dias de todos, possui a sabedoria silenciosa de quem sabe ser essencial sem alarde. Ela, a sobrinha, uma mistura de sensibilidade com sua negação, antes extrema em suas contradições, hoje moldada pelo DNA que foi construído com as misturas de todos os DNAs desta família, reflexo e padrão desta constelação, complemento doce ao que construímos. 

 

Com ele, o sobrinho, veio também a moça doce que se fez parte, se fez casa, integrando esta constelação como peça, ainda temporária, mas que intui ser a peça que falta ao quebra-cabeças familiar.

 

Assim construí uma família, não apenas de sangue e osso, mas de escolhas diárias, de amor que se multiplica, de mesa farta onde o pão é alimento e vida, substância e símbolo, matéria e transcendência, de abraços que curam feridas antes de serem expostas. Esta é minha geometria sagrada do amor, perfeição imperfeita, humana, sublime. Uma casa onde o tempo para e contempla tanta beleza junta, tanto amor distribuído em copos que nunca se esvaziam.

 

E desta família toda, das qualidades e falhas que carrego, desta convivência que me lapidou sem me quebrar, tenho aprendido a ser outro permanecendo eu mesmo, o homem provedor não só de pão, mas de sonhos mastigados devagar, centralizador desta roda onde todos se sentam para ouvir as histórias que desafiaram e ainda desafiam a gravidade, irreverente como menino que quebra as regras só para ver se o mundo ainda funciona. Amoroso em doses precisas, misturo sensibilidade com altivez como quem tempera o amor com pimenta e mel, líder de mim mesmo primeiro, dos meus depois, ácido quando necessário, doce por vocação, salgado como lágrima de alegria.

 

No fim, sigo aprendendo que somos todos filhos uns dos outros, pais uns dos outros, irmãos nesta aventura de amar até que a vida diga basta. Mas enquanto há família, há infinito, e continuo descobrindo que a verdadeira arquitetura da felicidade se constrói com tijolos de afeto e cimento de determinação, uma vida inteira compreendendo que amar é a única ciência exata onde as somas se confundem com o infinito.

WITTEMBERGUE MAGNO
Enviado por WITTEMBERGUE MAGNO em 31/07/2025
Alterado em 01/08/2025
Comentários