MAGNO RIBEIRO
O poeta é um fingidor, finge tão completamente, que chega a fingir que é dor a dor que deveras sente
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ESPIRAL

 

No ar, a mesma pulsação invisível, a corrente que retorna, mais densa, entre nós, laçando o não dito ao pressentimento febril. São vontades que se reconhecem, ecoando nos mesmos vãos fundos da alma, onde o pensamento é o primeiro a se despir.

É o instante suspenso, onde a pausa se torna vertigem, o clarão entre a fome antiga e um frêmito que se renova. O banquete se refaz à mesa, mais farto, e a sede, antes aplacada, é sede outra vez, voltando à nascente de sempre, pronta para se fartar mais profundamente das iguarias.

Ainda à mesa, onde o apetite se refina ao toque e o desejo se condensa em silêncio, a pele se oferece como extensão do banquete. À medida que o mapa se revela em sua superfície, o olhar tátil da penumbra decifra seus relevos. Substitui as trilhas de ontem, os atalhos cômodos dos flancos, por uma ascensão vertical, o caminho que desce de cima, direto ao centro.

O território é o mesmo, mas a rota é outra: conduz ao abissal onde o ato, sagrado e carnal, alcança o momento que os franceses, com precisão e pudor, chamaram de la petite mort, esse instante em que o corpo se desfaz por um segundo e o olhar, suspenso, alcança o exato ponto da rendição.

Após o clímax, já vibra o presságio do que insiste em voltar, porque cada encontro anseia ser uma obra de arte em si. Perfeita. E, ainda assim, apenas o prelúdio sutil da próxima tela, sempre inspirada pelo sussurro divino ouvido no corpo de uma diva a revelar: o agora, em toda sua glória, não é fim, mas promessa de uma voragem ainda mais doce, de um mergulho que, em sua essência, será um retorno inevitável nesta espiral que dança entre o déjà-vu e o inédito.

WITTEMBERGUE MAGNO
Enviado por WITTEMBERGUE MAGNO em 02/08/2025
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