SINFONIA IRREPETÍVEL
A vida é uma sinfonia escrita para o breve palco que nos é dado.
Cada compasso existe apenas enquanto o tempo nos empresta o ouvido,
e cada um de nós é, ao mesmo tempo, criador do tema,
voz do refrão e ressonância do último acorde.
Há dias em ritmo acelerado,
como se fossem conduzidos por um movimento rápido e vibrante de Vivaldi,
em que o coração pulsa com a energia de quem quer dançar antes de pensar.
E há dias em andamento sereno,
como nas páginas mais suaves de Mozart,
onde cada nota repousa no ar e pede que se escute até a última vibração.
As melodias variam de coração para coração.
O bom intérprete sabe ouvir o silêncio entre as notas,
dar sentido até às pausas
e transformar dissonâncias em pontes para a harmonia,
como fez Beethoven na Nona Sinfonia,
onde a tensão abre caminho para o “Ode à Alegria”.
O mau intérprete apressa ou retarda o compasso,
fazendo o acorde maior soar sem brilho
ou o acorde menor perder a sua beleza sombria.
Na partitura da vida, há tons maiores,
que celebram como o amanhecer em As Quatro Estações,
e tons menores,
que carregam a melancolia sublime de Chopin.
Há sustenidos que elevam o tema além do esperado,
e bemóis que o trazem de volta ao chão.
Há dissonâncias inevitáveis,
notas que sozinhas parecem ferir o ouvido,
mas que, no todo, revelam-se necessárias
para que o acorde final tenha força e sentido.
E, entre uma música e outra,
o que muda não é a essência da arte,
mas quem cria o motivo,
quem mantém o sopro,
quem dedilha o arpejo que embala a história.
Quando o último compasso se encerrar,
não será a perfeição que ficará gravada,
mas a verdade com que cada nota foi vivida.
Pois, no tempo que nos é dado,
não há ensaio geral:
há apenas a apresentação.