ANTES DO SIM, DEPOIS DO NÃO
Na pressa do semáforo,
ninguém se pergunta por que corre.
Mas a luz vermelha. essa breve sentença,
interrompe os que ainda têm freio.
Para quem para, há pausa.
Para quem ultrapassa,
há o risco de nunca mais voltar.
Na esquina, mora a Prudência:
velha senhora de olhar fundo,
que já viu muitos se atropelarem,
não só com os carros,
mas com as próprias decisões.
Viu gente que atravessou a vida
como se fosse rua deserta,
e caiu sob o peso de si mesma
e dos outros.
E mesmo longe das ruas,
a velocidade permanece.
Ela sobe junto com o concreto,
habita os corredores, os elevadores,
os escritórios onde ninguém mais espera.
O elevador sobe em silêncio,
carregando ausências não ditas.
Cada andar é um andar de pressa,
cada rosto, um reflexo de cansaço.
“Bom dia” vira mecanismo,
“sim” vira resposta-padrão.
Na cidade, as palavras não firmam pactos,
encerram incômodos.
O homem que responde antes de pensar
não age, reage.
E ao reagir, tropeça no que não viu.
É como quem dispara o alarme
para fugir do eco,
confundindo ruído com razão.
Mas observa:
o pedreiro que mede mil vezes
antes do corte.
A mulher do mercado,
que revisa os preços em silêncio,
como quem calcula o amanhã.
O morador da rua,
que escolhe seu canto com cautela,
não por opção,
mas por instinto de permanência.
Eles, os sem palco,
são os que mais praticam a arte
de não agir em vão.
O prudente não é o lento:
é o que percebe
que há abismos sob os asfaltos,
há desastres em cada impulso.
Ele escuta o não dito,
vê o invisível,
pisa com chumbo nos pés
porque sabe:
o chão pode ceder.
Na cidade que nunca dorme,
só é livre quem sabe parar.
Só é sábio quem ousa calar.
Só é inteiro
quem não se entrega ao apelo fácil
do primeiro “sim”
ou do último “não”.