LUZ NASCIDA
Filha,
quando te vi pela primeira vez,
não me surpreendi.
Foi como lembrar de algo antigo
que nunca vivi, mas sempre soube.
Como se o mundo
guardasse teu rosto em segredo,
e só então
me deixasse ver.
Não precisei entender-te.
Fiquei em silêncio.
Como se escuta
uma música sem origem,
que a alma reconhece
antes do ouvido.
Não quis moldar-te.
Apenas tirei os espinhos,
desviei as pedras,
e esperei que teus pés
inventassem o caminho.
Não te prometo certezas.
Ofereço presença.
O silêncio que guarda,
não o que esconde.
A pausa onde o pensamento respira
antes de virar palavra.
Haverá dias
em que não saberei guiar.
E mesmo assim
estarei contigo,
como o vento que acompanha a folha:
sem tocar,
mas movendo.
E se um dia,
em meio à pressa,
uma leveza sem razão te visitar,
não estranhes.
É amor.
Não o meu.
O que passa por mim
só para chegar até a ti.
Na imagem, a sinopse desta minha Prosa Poética, e no fundo a obra “O nascimento de Vênus”, de Sandro Botticelli