O Tempo da Delicadeza
No primeiro tempo,
o amor se veste de urgência,
mas caminha em passos brandos,
como se o instante fosse eterno
e cada toque, um universo.
É quando o tempo é mais do que tempo:
é espera e entrega,
é sopro e chama,
é o entrelaçar de silêncios e promessas
no fio invisível da alma.
Amar é não dormir,
é manter os olhos acesos no escuro
para que não se perca um só segundo
do que poderia ser tudo.
No segundo tempo,
o amor adoece em sua própria plenitude.
Já não cabe nos corpos,
transborda pelos gestos não ditos,
pelas ausências ensaiadas.
É o tempo de partir antes do fim,
como quem salva o que ainda pulsa
da morte mansa do hábito.
É o momento em que a dor é lucidez,
e amar é, paradoxalmente, saber-se livre
do outro, e de si.
Mas há um terceiro tempo,
oculto como brisa em manhãs claras,
em que o amor, já despido de exigência,
retorna não como fardo ou fogo,
mas como encantamento.
É quando nada precisa ser dito
porque tudo já foi vivido.
E ainda assim,
tudo pode renascer,
num passo leve,
num olhar suspenso,
num gesto que não quer possuir,
apenas permanecer ao lado.
Nesse tempo,
o tempo da delicadeza,
o amor não precisa mais vencer,
nem resistir.
Basta existir,
como uma flor que não implora por sol,
mas floresce mesmo assim.
Nota:
Este poema é inspirado na canção "Todo Sentimento", de Cristóvão Bastos e Chico Buarque. A composição, com sua melodia suave e versos profundos, conduz uma jornada lírica sobre o amor em três tempos, o da vivência intensa, o da despedida inevitável e o da esperança de um reencontro sutil, o chamado tempo da delicadeza.